quinta-feira, 9 de maio de 2002

A Falência das Terceiras Vias

Os resultados da primeira volta das eleições presidenciais francesas merecem uma reflexão:
Será que o que aconteceu traduz um crescimento da extrema-direita ou se resume a uma falta de capacidade e credibilidade dos partidos de esquerda para convencerem o eleitorado, dito por outras palavras, se os resultados eleitorais reflectem, acima de tudo, não uma vitória da extrema-direita, mas sim uma derrota para a esquerda?
Por certo aconteceram ambas as situações, mas poderíamos aproveitar para reflectir sobre a segunda hipótese, isto é, qual a posição, o papel e a força dos partidos de esquerda nas sociedades europeias actuais:
Se nos lembrarmos de que, nos últimos tempos, na Europa, os governos ditos de esquerda têm sido derrotados nas urnas, tal como aconteceu recentemente em Portugal, na Dinamarca, no passado ano em Itália, sendo que as eleições legislativas alemãs não reservam nada de bom ao SPD e ao Chanceler Shroder e até mesmo Tony Blair parece já ter conhecido melhores dias, inclusivamente dentro do seu próprio partido...
Posto isto, a questão é inevitável: Qual o motivo pelo qual isto acontece?
A resposta não é fácil de dar, muito menos poderá ser dada de uma maneira simplista, mas creio estar, indiscutivelmente ligada à acção governativa dos executivos de esquerda.
Entre a solução liberal, protagonizada pelos partidos de direita, e a solução chamada socialista e social-democrata, defendida pelos partidos progressistas, foi sendo concebida, na última década, a chamada ‘Terceira Via’, que visava conciliar uma economia liberal com preocupações sociais a fim de defender as classes mais desfavorecidas, ficando assim conciliadas as liberdades de iniciativa económica e a protecção das classes trabalhadoras e socialmente mais baixas, tendo esta linha orientadora sido protagonizada, a nível europeu, por Tony Blair, em Inglaterra, António Guterres, em Portugal, Shroder, na Alemanha, Romano Prodi, em Itália, e Leonel Jospin, em França...
Mas a solução da ‘Terceira Via’ não resultou, pois na prática, limitou-se a seguir uma política de direita de cariz neo-liberal, que teve como consequências o agravar das desigualdades e o acentuar as injustiças na distribuição da riqueza., o que conduziu ao descrédito dos partidos de esquerda junto do eleitorado, criando neste último a sensação de que votar num ou noutro partido ou candidato conduz, fatalmente, ao mesmo, ora foi o que aconteceu em França, já que o eleitorado não distinguiu as diferenças (como se, na prática, as houvessem...) entre Jospin e Chirac, optando pela pior alternativa possível: Le Pen e a extrema-direita, que tem o mérito de se apresentar como algo diferente do que já vem sendo costume e de ir ao encontro dos problemas reais das pessoas, nomeadamente o da segurança, apesar de uma maneira extremamente demagógica e prejudicial a um debate sério sobre as questões.
Creio que o único caminho que actualmente os partidos de esquerda têm a seguir, sob pena de não recuperarem o poder tão depressa, é o de não negarem a sua verdadeira identidade, apresentando-se como os verdadeiros defensores das classes trabalhadoras e mais desfavorecidas, a fim de que o eleitorado se convença de que o votar em outro partido implica uma verdadeira mudança de política.
O caso italiano tem sido o exemplo de como isto não funciona, com os partidos de esquerda a mostrarem-se incapazes de fazer uma verdadeira oposição ao governo de Berlusconi.
Para terminar, julgo urgente lembrar que se esta reflexão não for feita no interior de cada partido irão aparecer muitos mais Le Pens por essa Europa fora, que aos olhos do eleitorado se apresentam como a única alternativa a governos que se dizem de esquerda mas que praticam uma política de direita, descredibilizando-se a si e os ideais que supostamente defendem...