A muito aguardada “Reforma do Estado” foi finalmente
apresentada pelo irrevogável Vice-Primeiro-Ministro.
No final, são
incompreensíveis os sentimentos de choque e de novidade manifestados.
É que as medidas
anunciadas há muito que são do conhecimento público, não passando de uma
continuidade e intensificação do processo de destruição a que Portugal está
sujeito, não desde 2011, mas sim desde meados da década de oitenta, aquando a
introdução, na nossa política doméstica, da lógica neoliberal e do conceito do “Estado
mínimo”, por PS, PSD e CDS.
É evidente que a
entrada na moeda única em 1999 e o pedido de “ajuda” externa só agravaram a
situação de Portugal como entidade política autónoma, se é que isso ainda
existe.
Quanto às medidas
em si:
- Imposição da
chamada “regra de ouro” na Constituição: há muito que a Alemanha obrigou
todos os países colonizados pelo Reich a escreverem o limite ao défice na
respectiva Constituição, retirando toda e qualquer margem de manobra aos
Governos para lidar com as recessões económicas, agravando-as e prolongando-as
no tempo, por vezes indefinidamente e em espiral.
Cai assim o mito da
“recuperação da autonomia financeira” que tão mentirosamente é pregado pelo
actual Governo.
A Espanha já alterou
a sua Constituição, num acto de subserviência a Berlim. Em Portugal, só com os
votos do PS isto será possível. Aguardemos se esse mesmo PS volta a alinhar com
a Troika e com a destruição do país, ou não passa de um partido com retórica de
esquerda, mas com política de direita;
- Despedimentos
na Função Pública: há muito que sabemos que irão ser feitos, afectando a
qualidade dos serviços prestados às populações. Repartições de Finanças,
Conservatórias, Centros de Saúde, Escolas… já todos sentimos na pele a redução
de pessoal. Quem não está horas nas filas, em qualquer um destes sítios? Será
ainda pior.
Como é evidente,
tem o objectivo simples de privatizar ou concessionar os serviços.
- Agregação de
Municípios: depois das Freguesias é um passo natural. A única agregação que
deveria ser feita, seria no âmbito da criação das Regiões Administrativas,
eleitas directamente pelas populações, substituindo as opacas CCDR’s, que não
passam de uma Regionalização de facto,
mas feita nas costas das pessoas, com órgãos sem rosto, pois não são eleitos.
Quem sabe o nome do Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional
da sua área, e as competências atribuídas ao dito organismo? Muito poucos.
É de lembrar que
são as opacas CCDR’s que gerem os Fundos Estruturais vindos da União Europeia.
Talvez isto explique muita coisa.
Na prática, agregar
Municípios destrói o poder local, contribuindo de uma vez por todas para a
desertificação do interior do país. E já agora, para a saturação do seu litoral,
devido ao êxodo da população;
- Segurança
Social: Cortam-se pensões e prestações sociais de doença, desemprego, deficiência
e dependência. Não falam de falta de dinheiro, mas preferem a mentirosa
retórica de que “o idoso está a mais”, “o desempregado não quer é trabalhar”, “o
doente está bom de saúde” ou “o deficiente não é tão deficiente assim”.
Quando o documento insinua
que é para privatizar, nada de novo, pois um sistema de Segurança Social
privado é uma “mina” para as seguradoras geridas pelos amigos do costume;
- Educação:
ainda não se atrevem a assumir que querem privatizar totalmente as escolas e o
ensino, mas ao referirem que as mesmas serão “independentes” estão já na antecâmara
do Estado que se descarta de uma das suas mais importantes funções.
Aliás, já deram
sinais disto mesmo aquando da criação do hediondo “cheque-ensino”, que só serve
para pagar a educação dos ricos nos colégios privados, ao mesmo tempo que se
desviam recursos da escola pública. Num país em que a mobilidade social sempre
foi um mito, com uma Educação privatizada nem a mito chegará;
- Saúde:
privatização dos Hospitais, dos Centros de Saúde e desmantelamento do SNS. Quem
quiser saúde paga, os outros que morram à vontade. Com o aumento das Taxas Moderadoras,
já existem pessoas que deixaram de ir ao médico quando precisam.
Até os Estados
Unidos estão a dar tímidos passos para corrigir esta aberração, com o famoso “Obamacare”.
Só na Europa se vai em sentido contrário.
Os únicos a ganhar
serão as seguradoras e os grandes grupos económicos, futuros proprietários da
defunta rede de Hospitais públicos;
Em suma, a chamada
Reforma do Estado reitera as políticas de destruição desse mesmo Estado, da Economia,
do país e das pessoas, que há muito vão sendo postas em prática, com as
consequências que todos sentimos na pele.
Lendo o documento,
percebemos que essa mesma “reforma” não é movida por questões económicas ou
financeiras, mas sim justificada ideologicamente no neoliberalismo radical e
extremista dominante na Direita portuguesa. Por sinal, exactamente com a mesma ideologia
que nos trouxe ao tal “Estado a que chegámos”.
Limitam-se a acentuar
os erros e acelerar a degradação da estrutura do Estado e do país, até à
destruição total das funções do Estado Saúde, Educação e Segurança Social, seu
objectivo final.
Só pode ser classificado como um perigoso extremismo ideológico ao
serviço de grandes interesses financeiros privados, que urge pôr fim.