quarta-feira, 11 de novembro de 2020

A cavar no sítio errado



Parece ser intenção deliberada do Governo colocar nas famílias o ónus do previsível descontrolo da situação, quer nas urgências e UCI's hospitalares, quer nas incomportáveis conseqüências económicas de um cada vez mais inevitável novo confinamento.

Enquanto se morre de Covid, muitos imbecis insistem em não cumprir regras, seja em casamentos sem regras, a ir ver as ondas para a Nazaré, em corridas de Fórmula 1, ou em encontros de "tunning"; já para não falar nos ambientes laborais sem condições mínimas, nos transportes públicos ou nas escolas.

É falso e muito injusto que a "culpa" pelo aparente descontrolo da propagação do vírus seja das famílias e dos convívios familiares.

Parece que o Governo trata de reprimir o que não dá problemas e mantém aquilo que, de facto, é a causa da maioria dos contágios!

Assim, não vamos lá!

Tal como diz o gráfico da DGS, se a causa principal dos contágios for o natural contacto entre os membros do mesmo agregado, tornam-se totalmente inúteis as medidas anunciadas de Recolher Obrigatório.

Por que raio nos mandam ir para casa, se é lá que mais apanhamos Covid, de acordo com a própria DGS??

A não ser que o bicho entre sozinho em casa das pessoas...

Quanto muito, significa que pelo menos um dos membros do agregado foi contagiado fora do ambiente caseiro.

E se assim é, torna-se falso - para não dizer mentiroso - dizer que a causa da maioria dos contágios sejam as famílias; antes é o ambiente laboral e social onde cada indivíduo está inserido a causa primeira das novas infeções.

As inúmeras excepções previstas no Recolher Obrigatório tornam o mesmo totalmente inútil no combate à propagação da doença.

Continuamos a sair para compras, a trabalhar, a ir à escola, ao shopping, a utilizar transportes públicos e alguns de nós, até se dão ao luxo - e à irresponsabilidade - de socializar, pois a mensagem que o Governo passa é que o vírus é seletivo, que tem horas e locais marcados para atacar.

Aqui pode, ali não pode; acoli é perigoso, mas se for a certas horas, já é seguro...

Ao tentar ganhar tempo e ao agir nos locais e situações erradas, o Governo e a DGS só vão conseguir que o vírus se continue a propagar descontroladamente, com conseqüências cada vez mais dramáticas para a saúde e para a economia.

Alguns dos nossos parceiros europeus parecem já ter percebido que só um segundo confinamento, feito a sério e não a brincar, nos salvará de um incêndio de proporções bíblicas.

O problema é que esse segundo confinamento significará um incalculável preço económico e social, não tendo o Governo português coragem para o decidir.

Pior que tudo: acabará por ser forçado a decidi-lo quando os médicos começarem a escolher quem vive e quem morre, quando os jornais estiverem inundados de famílias enlutadas e indignadas por o SNS ter deixado morrer o seu ente querido (e muitos aproveitarão para colocar em causa a existência do próprio SNS por isto).

Mas aí, já será tarde para muitos; até para a própria economia.

Se é preciso fazer, que se faça, por muito doloroso que se torne.

É que ainda mais doloroso, tanto para a economia, como para a saúde, como ainda para a própria existência de todos, é o continuar deste arrastar da situação, que levará o país para um abismo no qual ficará por décadas.