O ano de 2018 não ficará marcado
por nenhuma notícia ou acontecimento, que de modo isolado, possam ser
considerados marcantes ou determinantes do curso da História.
Daqui por cinqüenta ou cem anos,
pouco nos lembraremos do ano que agora finda e não o associaremos a nada de
específico.
Não obstante, foi 2018 o
confirmar e o acentuar de várias tendências que já se vinham verificando desde
anos anteriores, nomeadamente, a lenta decadência dos Estados Unidos como
superpotência dominante, dando o seu lugar às potências eurasiáticas, a
ascensão do Fascismo na Europa e no Brasil, e o agravamento progressivo das conseqüências
das alterações climáticas.
Quanto aos Estados Unidos, a sua
lenta decadência como superpotência dominante foi iniciada subtilmente, com a
invasão do Iraque, em 2003.
Declínio que Trump faz questão em
acelerar, com uma política externa sem estratégia, sem fio condutor e sem racionalidade:
do progressivo desinteresse pela defesa da Europa, cedendo lugar à Alemanha; à
retirada da Síria, cedendo lugar à Rússia; da obsessão com a construção do muro
na fronteira mexicana, que ameaça paralisar os próprios Estados Unidos (!!!);
ou à inconseqüente cimeira com o líder norte-coreano.
Trump não se move pela lógica ou
pelo planeamento, antes por um egoísmo mesquinho, contraproducente e de vistas
muito curtas, que prejudica os próprios interesses norte-americanos e o papel
dos Estados Unidos no mundo, que já está a ser preenchido por outros atores.
No espaço político e militar deixado
vazio pelos Estados Unidos, continuaremos a verificar a ascensão das três
potências euroasiáticas no seu continente (mas não fora dele, por incapacidade):
a Alemanha a ocidente, a Rússia no meio e a China, a oriente.
No caso alemão, tal como já fazem
na política económica e monetária, aproveitarão a estrutura da União Europeia
para impor a sua política externa e de defesa; à moeda, em vez de lhe chamarem
“Marco”, chamaram-lhe “Euro” e às forças armadas, em vez de lhe chamarem
“Wehrmacht”, chamar-lhe-ão “Exército Europeu”, o que será o consumar de um
processo que levará à ascensão da Alemanha como potência continental dominante,
algo que ambas as guerras mundiais tentaram evitar, em vão.
O único limite ao poder alemão
sempre foi e será, a sua manifesta incapacidade de se tornar numa potência
global. Isto é, mandarão na Europa, mas não no mundo.
Quanto à Rússia, terá como maior
desafio confirmar o seu regresso ao estatuto de ator global, consolidando a
transformação do tirano Al-Assad em mera marioneta de Putin, tornando também o
dependente Irão numa espécie de seu estado subsidiário (mais um erro de Trump,
que ao rasgar o Acordo Nuclear, colocou o Irão na órbita chinesa e russa),
correndo definitivamente com norte-americanos, israelitas e sauditas dos
assuntos sírios, impondo-se como interveniente no Médio Oriente.
Depois da Crimeia, conquista ainda
não consolidada, não será conveniente a Putin “esticar mais a corda” na Europa
de Leste, pelo menos, por enquanto. A seu tempo o fará.
O centro do mundo político e económico
já se encontra no extremo-oriente e a China já é o seu principal protagonista.
Detentora de biliões em títulos
de dívida norte-americanos, vencerá a guerra comercial que lhe impôs Trump,
destronando os Estados Unidos, como principal potência económica mundial, mais
cedo do que as previsões apontam.
De um ponto de vista
geoestratégico, a China continuará inflexível nas questões das ilhas do Mar do
Sul da China, de Taiwan e da Coreia, sendo que as duas primeiras serão sempre
motivo de tensão e em último caso, da possibilidade de uma guerra entre as
potências.
Também continuará a China, a
investir discretamente em infraestruturas e matérias-primas, em África e na
América Latina, adquirindo uma influência crescente na política doméstica de
muitos dos países dessas regiões.
A médio-prazo, o seu crescente
poderio militar e a sua influência económica em quase todo o globo, fará da
China a única superpotência com capacidade de intervenção global.
Quanto à ascensão do fascismo na
Europa e não só, a mesma é confirmada pela eleição de Bolsonaro, pelo lento
definhamento do “fenómeno Macron”, cuja tradução visível é o movimento
conhecido como “coletes-amarelos” e pela generalização à escala mundial da rejeição
e do ódio aos imigrantes e refugiados.
Estes acontecimentos acentuam uma
tendência de crescimento da mentalidade e dos partidos fascistas, verificada
desde que os partidos convencionais do “centrão” político deixaram de se
constituir alternativa credível e os partidos de Esquerda tudo fazem para se
integrar nesse mesmo “centrão”, criando nos cidadãos uma sensação de abandono
pela classe política.
Esse distanciamento que nos leva
a considerar os “políticos todos iguais”, essa percepção de diferença entre “nós
e eles”, esse mundo aparte em que os políticos vivem e a partir do qual
governam, poderá ter a sua mais grave e perigosa conseqüência, na tomada do
poder por movimentos fascistas, já perceptível como uma mera questão de tempo.
Fascistas que jamais se integrarão
no sistema da democracia representativa, que consideram responsável por mil
males, antes tentarão impor o seu próprio sistema de ódio e de segregação de
tudo o que é diferente.
Por último mas não em último, as
alterações climáticas, com tudo o que implicam: incêndios florestais cada vez
mais dramáticos, subida da água do mar, escassez de alimento e de espaço
habitável, extinção de animais…. e nós, Homo Sapiens, continuamos a fazer muito
pouco para as mitigar, pois insistimos em manter os interesses económicos de
uns poucos, por cima dos interesses de um planeta que se queria de todos.
E enquanto assim for, tudo irá
piorar, até deixar de haver planeta. Se não ganhámos juízo até agora, duvido
que o façamos sem que um acontecimento cataclísmico nos obrigue a mudar de
ideias.
Até lá, a “festa” continuará.